Aline D’Eça
O entrevistado dessa edição é Sheldon Menezes
1. Na literatura espírita, o termo espírito é empregado ora com inicial minúscula ora com inicial maiúscula. Você pode nos explicar por quê?
1- R – Essa diferença surgiu a partir da 2ª edição de O Livro dos Espíritos. Allan Kardec passou a utilizar a palavra espírito com “e” para se referir ao princípio inteligente do Universo, que está associado à matéria. Ele passou a usar a palavra espírito com “E” para se referir ao ente, ser inteligente, ligado ao perispírito.
2. Na questão 76 do Livro dos Espíritos, de Allan Kardec, a resposta para a pergunta sobre quem são os Espíritos é que são “os seres inteligentes da criação” que “povoam o universo, fora do mundo material”. Você pode comentar essa resposta?
2- R – Kardec traz o esclarecimento de que Deus cria o espírito e a matéria. O Espírito é o ser inteligente, diferente da matéria. Cabe ao Espírito, como ser inteligente, manipular ou coagular a matéria nas transformações que ocorrem no Universo. Como a expressão de Deus no Universo.
3. Ainda nessa questão, há uma nota no livro pontuando que “a palavra Espírito é empregada aqui para designar as individualidades dos seres extracorpóreos e não mais o elemento inteligente do Universo”. Qual a importância dessa palavra “individualidade” na concepção do que é o Espírito?
3- R – Ele quis deixar claro que, apesar de sermos Espíritos, somos seres únicos, individualidades singulares, cabendo a cada um a trajetória pessoal na jornada evolutiva.
4. Qual o impacto para a compreensão da vida e da morte de que os Espíritos são pessoas?
4- R – O impacto está na importância de se perceber, de forma clara e objetiva, um ser, verdadeiramente, imortal, que reencarna sucessivas vezes para a aquisição de habilidades e competências.
5. E para o processo mediúnico, de comunicação com os Espíritos desencarnados, essa concepção muda a relação que temos com eles?
5- R – Certamente. A relação passa a ser de pessoa a pessoa. São pessoas interagindo, com todas as suas peculiaridades típicas.
6. Na Universidade Livre do Espírito cada aluno é estimulado ao reconhecimento de que “é um Espírito imortal”. O que muda quando passa a pensar assim?
6- R – Muda a compreensão da vida como uma construção contínua e oportunidade de aquisição de valores que são agregados ao espírito que se é. Muda o entendimento de que se é fruto de outras tantas vidas e de que outras tantas vidas virão. A certeza de que nada se perde e de que novas encarnações se seguirão. Que as relações e o aprendizado que foram construídos não desaparecerão. Pelo contrário, servirão de base de novas experiências.
7. Tendo em vista as sucessivas reencarnações, o Espírito é a mesma pessoa vivendo momentos diferentes da sua história?
7- R – Podemos dizer que o Espírito é a individualidade que reencarna sucessivamente, através de diversos personagens distintos, para a aquisição de habilidades e competências. O personagem que sou hoje não retornará.
8. Existe diferença entre “ser uma pessoa” e “ser um personagem”?
8- R – A ideia de personagem surge para reforçar o conceito de que vivemos sucessivas e distintas encarnações, e que elas fazem parte de um processo evolutivo. Muitas vezes, se tem a ideia de pessoa como algo eterno ou que, se retornar, será igual, inclusive fisicamente, o que não teria o menor propósito. A vida que se teve, a pessoa que se foi, serviu para determinados aprendizados. Nova vida com novas experiências se faz necessária na longa jornada evolutiva do Espírito.
9. O psiquiatra Carl Jung cunhou o termo individuação para designar o processo pelo qual a pessoa se torna quem se verdadeiramente é, um ser diferenciado e singular. Como utilizar essa concepção tendo em vista as sucessivas vidas do Espírito?
9- R – O aprendizado do Espírito se dá, normalmente, nas suas trocas na coletividade, mas é importante que se perceba como ser único, diferenciado, singular. A consciência dessa individualidade a cada vida vai, principalmente, ao Espírito, a cada oportunidade encarnatória que se tem. Perceber-se Espírito, tendo uma experiência espiritual singular, própria. Compreender-se estar no mundo sem ser do mundo.
10. Gostaria de deixar uma mensagem final sobre esse tema?
10- R – É importante se perceber espírito imortal, senhor da própria vida, atravessando inúmeras encarnações, mas sempre o responsável por tudo que se vive. Uma construção contínua e irrefreável até tender à perfeição.