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Entrevista

Viver como Espírito – Com Adenáuer Novaes

Entrevistadora: Ana Carmen Segura

Nosso entrevistado é Adenáuer Novaes, que está lançando seu mais novo livro “Viver como Espírito”. Este livro é um convite a que aprendamos a viver como Espírito, alçando voos cada vez mais altos e desafiadores que nos levem à ampliação de nossa Consciência, buscando nos destituir de crenças e teorias ultrapassadas e alienantes. Vamos conversar um pouco com ele sobre esse tema.

Revista ULE: Adenáuer, o aprendizado de viver como Espírito perpassa pelo processo de autorrealização e de autodeterminação?

AN: O processo de autorrealização e o de autodeterminação não é instantâneo; é um processo de longo curso que requer, talvez, algumas encarnações. No entanto, viver como Espírito é algo que você pode começar agora, mesmo que não tenha se realizado, mesmo que não tenha alcançado sua autodeterminação, pois, é a partir de certas experiências, como Espírito encarnado, que você começa a entender que viver como Espírito é possível, não é algo absurdo ou algo extremamente transcendente que não se possa fazer. Qualquer pessoa pode começar a viver como Espírito, dando continuidade ao processo de autorrealização e ao de autodeterminação.

Revista ULE: Em nosso processo evolutivo, vivenciamos alegrias, dores, obstáculos, desafios, sucessos e insucessos. Que habilidades devemos integrar para compreendê-los como caminhos que nos levam à nossa evolução?

 AN: A integração de habilidades se dá nas infinitas experiências que o Espírito vive, quer encarnado, quer desencarnado. Às vezes, uma dificuldade ou uma derrota permite a integração de uma habilidade, ou mesmo em uma vitória. O espectro entre derrota e vitória de experiências é muito grande e, a todo momento, o Espírito integrará habilidades independentemente de sua consciência em relação a isso. Nas várias atividades da vida, principalmente em família, é possível se viver integrando habilidades. É um processo constante, contínuo e necessário para todo ser humano. Amar talvez seja a máxima habilidade, a mais importante, que deve estar presente em todos os atos da vida de uma pessoa: buscar sentir o amor. Quando um Espírito sente o amor, ele dá um salto evolutivo, integra uma habilidade muito significativa, talvez seja a mais importante no atual estágio de evolução em que o Espírito se encontra a Terra.

Revista ULE: “O não da Autodeterminação” é um dos capítulos desse livro. Esse tema se refere a inabilidades do Espírito ou à não aquisição de habilidades do Espírito ou são a mesma coisa? Ou está relacionado à sua conscientização de que é protagonista de tudo que lhe acontece?

AN: São a mesma coisa. O não da Autodeterminação, ou o não da evolução, é algo necessário. Dizer não ao personagem, à sua época, a certos vícios, a hábitos arrigados, a tradições culturais, a condicionantes sociais, a costumes familiares, quando todos contrariam o viver como Espírito, é importante e necessário para que possamos avançar. Enquanto não aprendermos a dizer não a nós mesmos, estaremos querendo dizer não aos outros. Então, sim, é importante aprender a dizer não.

Revista ULE: E esse não da Autodeterminação, podemos dizer que ele também está relacionado à conscientização do Espírito de que ele é protagonista de tudo que lhe acontece?

AN: Sim. Creio que esse protagonismo é fundamental para que tenhamos consciência das habilidades que estão sendo integradas. É importante que essa consciência exista, que essa consciência aconteça. Eu noto também que muitas pessoas, não tendo consciência de que são Espíritos imortais, deixam de lado certas habilidades que poderiam ser integradas ao personagem se tivessem essa consciência. Penso que estamos caminhando para uma sociedade em que a consciência da imortalidade vai se tornar cada vez mais presente.

Revista ULE: Que fatores podemos considerar limitadores ao Espírito quanto à aquisição de habilidades, na sociedade em que estamos inseridos?

AN: Talvez o fator mais importante, que dificulta a integração de habilidades, do ponto de vista social, é uma Humanidade, ou uma sociedade, limitada por horizontes materiais, por horizontes de uma única vida, por horizontes que afirmam e entregam ao ser humano a esperança apenas de uma vida após a morte melhor. Não há uma visão integradora de uma continuidade evolutiva para sempre, de um eterno presente. Então, o fator mais limitador da sociedade são os horizontes pequenos dessa mesma sociedade. Não digo somente em relação ao materialismo, refiro-me à limitação em todos os campos da vida: não se vê a individualidade exuberante que é o Espírito, a sociedade não enxerga dessa forma. A sociedade limita o personagem e, consequentemente, o Espírito.

Revista ULE: Para que haja a aquisição coletiva de habilidades, qual deve ser a contribuição do Espírito à sociedade em que vive encarnado como um Personagem?

AN: É viver intensamente a consciência de que é um Espírito imortal, viver em todos os campos, em todas as dimensões da vida porque, vivendo como Espírito imortal, será espelho para muita gente. Então, é vivendo plenamente sua condição de imortal que ele contribui com a sociedade.

Revista ULE: Há entraves que impedem o ser humano de viver como Espírito?

AN: Há muitos entraves. Primeiro, a visão limitada de que é apenas um corpo: a maioria das pessoas se preocupa mais com a integridade do corpo do que com a transcendência do Espírito, portanto, essa visão acanhada de si mesmo é um fator limitador muito grande. O outro entrave é não ter uma perspectiva de vida além do sucesso pessoal na encarnação: basta, para muitos, ser feliz, como se ser feliz fosse o ápice da evolução. Ser feliz é uma conquista natural, pois todo mundo deve ser feliz a qualquer tempo, a qualquer momento. Então, a felicidade utópica é um fator muito limitador e, eu creio, que é até desnecessária.

Revista ULE: A história da Humanidade nos traz reflexões sobre a fé – cega e raciocinada –, a razão, o sentimento e a intuição. Como o Espírito pode analisar essas faculdades psíquicas de forma a ampliar sua percepção da realidade em que está contido?

AN: A fé sempre foi um meio de se ver além, mas é um meio limitado a uma crença, limitado a uma imaginação, a uma falsa certeza de algo que não se conhece. A Humanidade evoluiu para ir além da fé, trazendo a razão, trazendo a ciência, trazendo a vida prática, a qual exige muito mais do que a fé. Parece-me que há que se avançar além da fé, há que se ir a um raciocinar e a um sentir simultâneos. O sentir vai além da razão, vai além da fé, é uma experiência direta e pessoal. Acho que quando conquistarmos esse “sentir a vida”, conseguiremos ir além do que a fé tem oferecido.

Revista ULE: O que vem a ser pragmatismo espiritual?

AN: Interessante essa pergunta porque eu venho pensando sobre isso já há algum tempo, sobre a necessidade de sermos um pouco mais realistas na relação com a Dimensão Espiritual. Há muitos medos, muitas crendices, muitos condicionamentos que impedem uma pessoa de enxergar a Dimensão Espiritual como algo natural. Então, para mim, o pragmatismo espiritual é uma naturalidade na relação com o espiritual, é uma naturalidade de se viver o espiritual sem considerar que é sobrenatural, sem pensar em morte e sem os medos atávicos que costumam limitar a percepção do que é o espiritual. Isso é pragmatismo espiritual. Ser uma pessoa espiritualmente pragmática não requer confirmação de absolutamente nada porque, quem se sente Espírito, quem se vê como Espírito, não precisa de prova alguma. O pragmatismo espiritual não é o “ver para crer”; é encarar a Dimensão Espiritual como uma dimensão de realidade – objetiva, física, material, como qualquer outra realidade.

Revista ULE: As predisposições podem interferir no saber viver como Espírito de que forma?

AN: As predisposições são possibilidades de vivências aversivas ou até mesmo vivências positivas. Elas precisam ser trazidas à Consciência para que o Espírito possa retirar as que são aversivas e se beneficiar das predisposições que são positivas. Se não há consciência, não haverá mudança. As predisposições aversivas poderão se confirmar, mesmo sendo úteis, atrapalham um pouco o processo de evolução do Espírito. Melhor que se tenha consciência das predisposições para poder mudar o próprio destino.

Revista ULE: Modelando o Personagem, o Espírito pode alterar uma predisposição psíquica enquanto constrói o seu destino? Como isso se dá?

AN: Pode, mas a modelagem é um início, é uma tentativa, mas não é suficiente, porque eu posso criar um modelo de mim mesmo sem ter integrado habilidades. Por exemplo, eu posso determinar a mim mesmo que eu não devo brigar com ninguém, que eu não devo ser uma pessoa agressiva com ninguém, mas, ao modelar o Personagem, vou restringir o Personagem a esse modelo, e isso não quer dizer que eu tenha aprendido a educar a minha agressividade. Então, a modelagem é um exercício, é uma técnica, é um meio, não é o fim em si. Para modificar predisposições, talvez não seja suficiente só modelar, é preciso ter consciência de quais são e de sua intensidade. A modelagem é uma espécie de educação do Personagem para atender ao Espírito.

Revista ULE: Quanto às tendências do Espírito, podemos identificá-las, analisando a trajetória do Personagem?

AN: Sim, podemos identificá-las pela trajetória do Personagem ano a ano, desde que nasceu. Analisando as circunstâncias em que se envolveu, em que foi educado, criado etc., e as escolhas que fez, podemos ter uma ideia de suas tendências, mas não da totalidade delas.

Revista ULE: Quando analisamos o fator tempo sob a ótica do Espírito e sob a ótica do Personagem, perguntamos: como o Personagem deve fazer uso do tempo para atender aos objetivos do Espírito que ele é?

AN: O tempo do Espírito é infinito, o Espírito não está sujeito ao tempo porque é um ser eterno e está sempre vivendo um eterno presente, pois não há mudança de tempo, de ano, de dia, de semana, de mês, de ano. O Espírito é o senhor do tempo. O Personagem não, ele se submete ao tempo por estar restrito a um corpo que tem limites, que tem um prazo de validade, que está numa Dimensão Material regida pelo sol, pelo nosso Sistema Solar. Então, o tempo do Personagem é um tempo limitado. Mesmo assim, é possível ao Espírito aproveitar esse tempo do Personagem – 80, 100 anos de uma vida –, mas sabendo que, restringir a uma vida, restringir a esse tempo do Personagem à conquista das suas habilidades, também é um fator limitador. Temos que pensar a longo prazo, conscientes de que certas habilidades a serem conquistadas não são possíveis em uma vida. Temos que ter, então, discernimento para avaliar como aproveitar o tempo do Personagem. Só para exemplificar, algumas habilidades devem ser conquistadas na adolescência, desde a idade adulta jovem. Se isso não ocorreu, querer conquistar essas habilidades aos 70 anos, aos 80 anos é impossível. A integração dessas habilidades deve ser adiada para uma próxima encarnação porque o tempo do Personagem é limitadíssimo às condições físicas, psicológicas da encarnação. Então, sim, é possível aproveitar o tempo do Personagem, mas entendendo que nem tudo pode ser conquistado numa encarnação e que o Espírito é quem avalia adiar a busca e a aquisição de novos conhecimentos.

Revista ULE: Sobre a linguagem da Vida, você nos diz que é pessoal a tarefa de encontrá-la, “sobretudo quando entendemos os limites impostos pela cultura vigente na educação do Personagem.”. O que deve fazer o Espírito para, alcançando-a, assimilá-la e integrá-la?

AN: A cultura atual, a cultura vigente limita muito o Espírito porque limita o Personagem nas indagações, nos questionamentos, impõe medos. Então, o que deve o Espírito fazer? Impor ao Personagem certas exigências de performance, impor ao Personagem um confronto com a sua época, com o seu meio, para que ultrapasse os limites estabelecidos pela sociedade. Portanto, o Espírito deve levar o Personagem ao confronto.

Revista ULE: No livro, você nos diz que “A Vida está em permanente diálogo com o Espírito, independentemente de seu estágio de evolução, visto que permeia todos os momentos e experiências para alcançar sua singular finalidade.” O que pode o Espírito extrair desse diálogo com a Vida?

AN: Extrair tudo. O conceito de Vida – com V maiúsculo – engloba as relações do Espírito com o Divino, engloba tudo que existe na Natureza como força impulsionadora da integração de habilidades ou impulsionadora da evolução. Então, esse diálogo deve ser permanente. Devemos aproveitar para ficar atentos aos sinais de que a vida está dialogando, devemos ter uma expertise de como enxergar a Vida, enxergar essa entidade, esse fenômeno virtual chamado Vida e como ela conversa conosco em todos os momentos – não especificamente no contato religioso ou no exercício de uma atividade caridosa –. A Vida está sempre dialogando com o Espírito.

Revista ULE: Quanto a possíveis consequências de quem integrou a consciência de sua imortalidade e vive como Espírito, você pode falar um pouco sobre isso?

AN: É uma conversa interessante porque se trata de um modo diferente de viver e isso causa estranhamento na sociedade, na família, isso causa uma surpresa quanto a mudanças de comportamentos que, quem vive como Espírito, passa. As pessoas exigem uma normalidade social, uma normalidade familiar, e quando você modifica, sai dessa normalidade, há uma preocupação “O que está acontecendo com fulano, com fulana, será que está doente, será que está mentalmente prejudicado?”. Então, é preciso ter um pouco de paciência com a sociedade quando ela cobra uma normalidade, mas é preciso persistir no processo de viver como Espírito. O estranhamento social é o principal problema, mas há também a solidão. É um processo solitário, você com você mesmo, você não se sente interlocutor porque ninguém está no mesmo estágio em que você se encontra. Então, há várias consequências que devem ser compreendidas, assimiladas, mas não se deve perder o objetivo de se alcançar essa consciência da imortalidade de se viver como Espírito.

Revista ULE: Ao falarmos sobre o Espírito em psicoterapia, logo associamos à Psicologia do Espírito. Qual a importância do trabalho do psicoterapeuta e de que forma ele pode ajudar a que seu paciente faça o alinhamento do Espírito com o Personagem?

AN: A psicoterapia do Espírito é uma psicoterapia profunda, pragmática, que estabelece uma relação Espírito a Espírito no setting terapêutico, então é uma relação verdadeira, direta e profunda. Isso traz consequências muito grandes, mas nem sempre alcançável pelo paciente, nem sempre ele se vê como Espírito. O objetivo da psicoterapia não é doutriná-lo a se ver como Espírito, mas de retirá-lo da sua angústia e da ignorância sobre si mesmo, na expectativa de que um dia aquele indivíduo consiga se ver como Espírito. É mais um modo de viver a psicoterapia, que gera uma instabilidade na normalidade do paciente: ele vai se sentir diferente quando confrontar o que ele ouve na terapia com o que a sociedade lhe diz. Esse confronto é salutar, é saudável, e vai gerar mudanças no paciente. O olhar do psicoterapeuta é um olhar de Espírito para Espírito.

Revista ULE: “Sentir Deus é meta evolutiva para que se retirem os atributos humanos que dificultam o entendimento do sentido e significado do viver.” é um trecho de seu livro. O que é sentir o Divino e que habilidade devemos integrar para senti-Lo?

AN:  É preciso desconstruir o entendimento que se tem a respeito de Deus, que é um entendimento que vem de milênios, que é um entendimento incrustado nas bases psicológicas do ser humano; é preciso destituir esse lugar denominado Deus. Não estou me referindo à não existência de Deus, mas, sim, ao lugar e aos atributos que foram dados a esse nome Deus. Tenho usado mais o Divino, para diferenciar do conceito tradicional de Deus. Então, essa desconstrução é preliminar antes de sentir Deus. É preciso desconstruir e não ter medo de fazer isso, não se sentir um herege ou um ateu por estar fazendo isso; é preciso ter muita coragem para retirar todos esses atributos que a religião coletiva colocou. No momento em que desconstrói – você não nega, mas desconstrói –, você fica no aguardo de que haja uma consciência de conexão diferente porque retirou todos os atributos humanos colocados em Deus. Em dado momento (isso aconteceu comigo), começa-se a sentir algo diferente, como se tivesse sido tocado por uma força impulsionadora, um entusiasmo, uma disposição diferente, e eu chamo isso de Divino, mas não tem qualquer adjetivo que qualifique a não ser esse sentir. É um sentimento de existência de algo muito mais profundo, misterioso, doce, leve, que eu chamo de Divino.

Revista ULE: E finalizando, o que é viver como Espírito?

AN: Viver como Espírito, para mim, é o ser humano viver a própria vida, realizar a sua natureza, não ter medo de ser quem é, não se dar importância para o outro, mas apenas para si mesmo, é não exigir que alguém reconheça nada, absolutamente nada, como meritório, apenas ser ele mesmo. Viver como Espírito é você tornar-se aquilo que você é, que é a própria essência de ser Espírito. Viver como Espírito é ser você mesmo.

“O viver como Espírito é um permanente estado pessoal, cujo horizonte a ser alcançado é a máxima realização de si mesmo a cada instante.”

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